segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Consumidores de energia reclamam de postura do TCU em julgamento de pagamentos indevidos de R$ 7 bilhões
Representantes da Frente de Defesa dos Consumidores de Energia Elétrica lamentaram terça-feira (07.08) a recusa dos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) em receber pessoalmente a petição a favor do ressarcimento dos consumidores lesados em R$ 7 bilhões por cobranças indevidamente das distribuidoras de energia.

A insatisfação ficou maior após serem informados de que pelo menos um dos Ministros do TCU, Aroldo Cedraz, acabara de receber o Presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Fonseca Leite.

"Apenas assessores e chefes de gabinete nos receberam. Já o presidente da Abradee foi recebido pessoalmente pelo Ministro Aroldo Cedraz. Isso demonstra uma clara desigualdade de tratamento entre as partes do processo", disse à Agência Brasil a Advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Mariana Ferreira Alves.

A informação de que Cedraz recebeu o representante das distribuidoras foi confirmada à Agência Brasil pelo gabinete do ministro que, quarta-feira (08.08), participará do julgamento sobre a cobrança indevida. A cobrança ocorreu porque houve um erro na metodologia de cálculo de reajustes ocorridos entre 2002 e 2009. A assessoria da Abradee informou apenas que seu presidente estava em visita ao TCU.

Apesar da situação, o Idec diz estar otimista com o julgamento, já que espera que os ministros mantenham coerência, porque foram os técnicos do tribunal que fizeram as primeiras denúncias.

"O erro foi descoberto e apontado em 2007 pelo próprio TCU e, conforme prevê a Portaria nº 25/02 [dos Ministérios de Minas e Energia e do Planejamento], o ressarcimento deveria ter sido feito em 2008. Apesar de os ministros não nos terem dado nenhuma sinalização, acreditamos que eles se manifestarão favoráveis ao ressarcimento, a exemplo do que já foi manifestado pela área técnica do TCU", disse a advogada do Idec.

A dificuldade para o ressarcimento está no fato de que as distribuidoras e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) são contrárias ao pagamento. Elas argumentam que como esse tipo de ressarcimento não está previsto no contrato de concessão, seu pagamento representaria quebra do contrato e geraria insegurança jurídica para o setor.

Mariana criticou a postura da Aneel que, segundo ela, tentou algumas vezes, sem sucesso, alterar a portaria que favorece os consumidores.

"Isso demonstra que o posicionamento da Aneel é em favor de um desequilíbrio que favorece as concessionárias. Além do mais, não procede o argumento de que o ressarcimento representaria quebra de contrato porque a cobrança indevida também não estava prevista em contrato. O que está previsto é o equilíbrio econômico e financeiro das partes envolvidas. E a Aneel claramente privilegiou uma das partes e desrespeitou a legislação em vigor", argumentou a advogada.

A Frente de Defesa dos Consumidores de Energia Elétrica é composta pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (ProTeste), pelo Procon e pela Federação Nacional dos Engenheiros, além do Idec.

Fonte: Agência Brasil

domingo, 26 de janeiro de 2014

EDUCAÇÃO INCLUSIVA: UM NOVO PARADIGMA CONSTITUCIONAL 
INTRODUÇÃO

Para o enfrentamento lúcido da presente temática, inicialmente, faz-se mister aclarar que a inclusão é um novo paradigma educacional adotado pela Carta Maior vigorante que tem por fito acolher em uma mesma classe regular os alunos tidos como “normais” e como “especiais”. Por educando especial, entenda-se não especificadamente a criança portadora de necessidade especial (PNE), mas também a superdotada ou a desestimulada nos estudos, a menos favorecida e a nascida em grupos étnicos ou religiosos tidos como minoritários. Neste sentir, estamos na linha de frente ao defendermos uma interpretação mais ampla da expressão educando especial. 
 
Historicamente, as crianças nascidas em grupos sociais marginalizados, não obstante o direito à educação, eram excluídas do processo de construção da cidadania ante a monopolização do acesso à educação por parte do Estado, ou quando muito, eram segregadas em instituições de cunho filantrópico ou religioso. É nesse contexto que surge a ideia de educação especial, que só foi rompida com a adoção de preceitos democráticos.

Neste passo, por mais que a temática da educação inclusiva tenha sido alvo de discussões no âmbito pedagógico, trata-se de fonte que não se esgota e de tema inovador, sobretudo para os operadores do Direito.

Com este estudo, busca-se apresentar a evolução do direito pátrio no tratamento da temática da educação, apontando a legislação referente ao lapso temporal entre o Texto Constitucional promulgado em 1988 e a atualidade, bem como analisar o sistema inclusivo educacional sob os olhares da psicologia e pedagogia, pois a investigação do tema caso restringida à superfície jurídica, seria defasada.

Buscando compreender este fenômeno sociojurídico em uma seara mais ampla, foi realizada pesquisa de cunho bibliográfico e de campo, comprovada em livros e material da internet. Neste intento, trouxemos a estas linhas as experiências por nós vivenciadas através de visitações a algumas classes regulares da rede pública do município de Juazeiro do Norte (CE), nas quais pudemos observar o comportamento de aprendizes, familiares e educadores dentro da dinâmica escolar.


RESULTADOS
Fundamentada na dignidade da pessoa humana e com o objetivo de erradicar toda e qualquer forma de discriminação, a Carta Política vigente é a primeira de nossas constituições a elevar a educação ao status de direito social, que na redação do art. 206, inciso I, será ministrado sob o princípio da igualdade de condições, para o acesso e permanência na escola.

 Neste passo, para efetivar o atendimento educacional especializado preferencialmente na rede regular de ensino, há que se ter como conditione sine qua non, o dever do Estado em garanti-la.

Inspirado na correlação dever do Estado versus direito do educando especial e baseado em tratados internacionais que tratam do fenômeno da inclusão educacional de meninas, negros e PNEs, o Brasil edita a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.384/96. Esta apregoa que o sistema de ensino deve assegurar currículo, métodos, recursos e organização específicos para atender às necessidades especiais educacionais de seus alunos. Para tanto não basta assentar todos os educandos numa mesma sala de aula, mas sim trabalhar o todo: alunato, corpo docente, escola e família.

Na realidade local, os professores têm sido capacitados e conscientizados para a relevância da vivência com a diversidade humana. Também contam com uma equipe psicopedagógica, onde juntos trabalham as ideias de que só nos tornamos pessoas quando nos relacionamos com os outros, e que a democratização do ensino só se manifesta com a promoção da equidade.

 Consolidando o movimento histórico, vivido, em 2009, o Ministério da Educação e o Conselho Nacional de Educação/Câmara da Educação Básica editam a Resolução nº 4, que regulamenta o Atendimento Educacional Especializado.  O AEE é um sistema paralelo de ensino que oferece uma gama de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos institucionalmente organizados, que têm como função complementar ou suplementar a formação do educando especial e não substituir a escolarização regular.

Dessa forma, o aluno especial possui dúplice matrícula, uma na rede geral de ensino e outra no AEE, ministrado em sala multifuncional de apoio especializado.

Ratificando o novo norte educacional adotado pela atual Constituição em 2011, é editado o Decreto nº 7.611 que regulamenta o art. 24 da Convenção Sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência.
 
Este dispositivo que tem como público alvo as pessoas com necessidades especiais, com transtornos globais de desenvolvimento ou com superdotação, garante ensino fundamental inclusivo gratuito e compulsório, com vistas a maximizar o desenvolvimento acadêmico e social do aprendiz especial.

Voltando à realidade local, os professores relatam que quando o AEE teve suas bases lançadas em 1996, apresentaram certa resistência, pois se já era difícil trabalhar com as crianças que estavam nos padrões normais de escolarização, seria ainda mais complicado ministrar aulas que alcançassem aqueles alunos que necessitavam de uma atenção maior. Contudo, à medida que foram se capacitando, compreenderam que o papel do professor para com o educando especial era o de socializá-lo e contextualizá-lo no ambiente escolar, ficando a escolarização a cargo de profissionais de suporte pedagógico especial.

Quando da implantação desse sistema, os familiares das crianças especiais se mostraram receosos em matricular seus filhos na rede regular de ensino, por acreditarem que a escola não estaria preparada para recebê-los e os demais alunos poderiam desenvolver atitudes preconceituosas em face dos aprendizes que não se enquadravam no grupo socialmente aceito.

Esta apreensão por parte dos familiares nos dias atuais, em regra não condiz mais com a nossa realidade. Ao passo que os alunos especiais se socializam ao se relacionarem com os alunos comuns, estes aprendem a respeitar a diversidade da pessoa humana.

 Note-se, aprender a conviver com as diferenças não seria o juízo de valor mais acertado uma vez que nos leva à ideia de tolerância, o que não foi observado. O que percebemos foi respeito e a valorização das diferenças ressaltando o seu caráter pedagógico.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Hoje o Direito sai de uma posição hierarquicamente privilegiada e apartada das demais ciências e se associa à psicologia e à pedagogia, para juntos promoverem a democratização do ensino e o desenvolvimento físico, mental e moral do alunato, de acordo com as peculiaridades de cada criança.

Deste modo, o Texto Máximo vigente atua metaforicamente como um imã, que traz para o centro de sua preocupação as crianças historicamente segregadas sempre que a temática discutida é a educação.

Isto posto, acreditamos que ao acesso à educação não cabe restrição, pois as particularidades de um indivíduo não podem ser óbice ao acesso à escola e permanência na sala de aula regular.

Nághela Gonçalves de Moura é estudante do curso de Direito pela Faculdade Paraíso do Ceará (FAP-CE).


domingo, 19 de janeiro de 2014

REFORMA PENAL FASCISTA IMPLODIRÁ PRESÍDIOS
Uma Comissão Especial de 11 Senadores aprovou, em 17 de dezembro de 2013, o Relatório Final do Senador Pedro Taques (PDT-MT), apresentado no dia 10 de dezembro, sobre o Projeto de Lei do Senado nº 236/12, que cuida do novo Código Penal. Procurou-se sistematizar em 355 tipos penais principais os mais de mil crimes hoje espalhados pelo Código de 1940 e em leis esparsas. Resta agora a apreciação do Plenário do Senado, para depois o texto ser enviado à Câmara dos Deputados.

VETO AO PROGRESSO
De plano, foram eliminados vários pontos progressistas aprovados pela Comissão de Juristas: (i) aborto nas 12 primeiras semanas da gestação, em razão da incapacidade psicológica da gestante de arcar com a gravidez; (ii) descriminalização da posse de drogas para uso pessoal; (iii) diminuição de penas nos delitos de furto e roubo etc. Na Comissão predominou, do ponto de vista ideológico, o pensamento dos conservadorismos e fundamentalismos religiosos (SANTOS, 2013, p. 65 e segs.), sociais (apartheid) e econômicos (KLEIN, 2008, p. 35 e segs.).

VIRTUDES E VÍCIOS
O novo texto tem suas virtudes: constitui uma tentativa hercúlea de sistematização da desorganizada legislação penal brasileira, o que é muito louvável; supre lacunas criminalizantes (terrorismo, enriquecimento ilícito, corrupção entre particulares, crimes cibernéticos, crimes contra a humanidade etc.) e descriminaliza centenas de crimes e contravenções penais. Mas, como toda obra humana, também conta com imperfeições (como o abandono errado da relação de causalidade). Dentre seus defeitos sobressai a ideologia fascista emergente da criminologia populista/midiática. Será considerado o Código Penal mais rigoroso (e desproporcional) de todos os tempos. Talvez essa seja mais uma marca do governo do PT (se o novo Código for aprovado e sancionado no seu Governo).
 
Os Códigos Penais de 1830 e 1890 eram humanizadores (tendencialmente civilizantes), em termos de penalidade. O rigorismo penal fascista, que começou com o Código de 1940, elaborado na ditadura do Estado Novo, encontrará agora o seu ápice celestial, sob as pulsões da mais hedionda de todas as criminologias (a populista/midiática), que é fruto de uma série de confluências ideológicas, nacionais e internacionais, que envolvem, sobretudo desde os anos 70 do século XX, os Estados policialescos norte-americano e brasileiro, o radicalismo cristão protestante bem como a doutrina do neoliberalismo econômico.1

Nas considerações finais do citado Relatório ficou esclarecido que:
  • Há, no Substitutivo, 355 figuras típicas, sem contar causas de aumento ou diminuição ou tipos privilegiados ou qualificados integrantes do mesmo artigo.
  • Desse total, existem 81 tipos penais cuja pena não excede dois anos, sendo, portanto, de menor potencial ofensivo. Em 7 deles há dispositivos de aumento ou qualificação que elevam a pena para a faixa seguinte.

  • São 185 crimes os que, na figura básica, admitem o regime inicial aberto e a substituição por pena restritiva de direitos. Destes, 24 trazem dispositivos de qualificação ou de causa de aumento impeditivos desses benefícios.

  • Há 126 crimes cuja pena máxima excede quatro anos, obstando o regime inicial aberto e a substituição por pena restritiva de direitos. Em 26 crimes desse grupo, há causas de aumento ou dispositivos de qualificação que elevam a pena para a faixa seguinte (igual ou maior do que oito anos).
  • Há 45 figuras típicas cuja pena excede oito anos, sem contar tipos dos grupos anteriores que, em razão de causa de aumento ou qualificação, podem alcançar esse patamar. Portanto, conclui o Relatório, “não se trata de um texto encarcerador. Muito pelo contrário. 52% dos crimes admitem regime aberto e substituição da prisão por pena alternativa”.

A FALÁCIA DO NÃO ENCARCERAMENTO
Nada é mais falacioso e equivocado que essa afirmação de que o novo Código Penal não será encarcerador. Com ele, haverá a implosão do sistema carcerário, já cruelmente massificado entre os anos 1990-2012 (508% de aumento da população aprisionada). Somente de 2003 a 2012 tivemos 77% de aumento, chegando a uma taxa de 283 presos para cada 100 mil habitantes, com estimativa da população para 2012 de 193 milhões de habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. O PCC nasceu (em 1992) quando o Estado policialesco paulista exterminou 111 presos na antiga Casa de Detenção em SP (que já não existe). É de se presumir que ele (ou outra entidade organizada, dentre as que dominam os presídios) manifeste algum tipo de resistência violenta ao draconianismo e despotismo carcerário do novo Código.

CRIMES LOTAM OS PRESÍDIOS
Quem conhece a realidade carcerária do País sabe que apenas 9 crimes são responsáveis pela quase totalidade dos aprisionamentos. Essa seletividade da atuação da Justiça penal aumentou ao longo dos anos de 2005 a 2011, de acordo com os dados divulgados pelo Departamento Penitenciário Nacional. O sistema penal foi feito para investigar e punir com prisão apenas alguns crimes (e alguns criminosos).

Os delitos de tráfico de entorpecentes (nacional e internacional), roubo (simples e qualificado), furto (simples e qualificado), homicídio (simples e qualificado), porte ou posse de arma, latrocínio, estupro (agora unificado ao atentado violento ao pudor), receptação e quadrilha ou bando (que agora se chama associação criminosa e crime organizado) que, em 2005 (acrescidos dos delitos de falsificação de documento e uso de documento falso), compunham 85% das prisões do Brasil, em 2011, passaram a compor 94%.
 
Basicamente, os mesmos delitos que mais encarceravam no ano de 2005 (responsáveis por 85% das prisões no País) continuam a dominar cada vez mais o Sistema Penal, já que em 2011 este percentual subiu para 94%. Significa dizer que enquanto 9 crimes aprisionam 94% do sistema penal, apenas 6% representam prisões por outros crimes. Todos esses crimes que mais superlotam os presídios, no novo Código Penal, tiveram tratamento mais duro (ou seja: vão encarcerar mais ainda, porque foi aumentado em todos eles o tempo de cumprimento da pena para o efeito da progressão).

FATORES DE IMPLOSÃO DO SISTEMA
Muitos fatores concorrerão para a implosão do sistema penitenciário, impondo-se destacar: (i) a criação de novos crimes (terrorismo, enriquecimento ilícito do servidor público, corrupção entre particulares, crimes contra a humanidade, crimes culposos gravíssimos, saque irregular de contas públicas, crimes cibernéticos etc.); (ii) o aumento de penas (homicídio – de 6 para 8 anos, no mínimo (são mais de 52 mil por ano); lavagem de capitais – pena até 18 anos; corrupção – de 4 a 12 anos); (iii) a facilitação para o processo criminal nos crimes de sonegação fiscal ou previdenciária e descaminho (aniquilando a Súmula STF nº 24); (iv) a perpetuação do critério confuso e potencialmente arbitrário para distinguir o usuário do traficante; e (v) a antecipação da consumação dos crimes patrimoniais etc.
 
Mas nada disso se equipara a duas tiranias (porque tirânica é toda pena desnecessária, dizia Montesquieu, recordado por Beccaria), que constituem os dois eixos centrais da lógica punitiva do novo Código: (i) o endurecimento brutal e desproporcional do sistema progressivo; e (ii) o alargamento absurdo e exagerado da lista dos crimes hediondos.

ENDURECIMENTO DA EXECUÇÃO DA PENA
Todos os crimes, especialmente aqueles do grupo mais encarcerador, terão endurecimento na execução penal (pouco importando se violentos ou não). Para a progressão de regime o preso deve cumprir (i) 1/4 da pena, se não reincidente em crime doloso (antes era 1/6); (ii) 1/3 da pena, se reincidente em crime doloso, se o crime for cometido com violência ou grave ameaça ou se o crime for contra a Administração Pública, a ordem econômico-financeira ou tiver causado grave lesão à sociedade (antes era um 1/6); (iii) 2/5, se condenado por crime hediondo; (iv) metade da pena, se o condenado for reincidente em crime praticado com violência ou grave ameaça à pessoa ou em crime que tiver causado grave lesão à sociedade (antes era um 1/6); e (v) 2/3 da pena, se reincidente e condenado por crime hediondo (antes era 3/5).

CRIMES HEDIONDOS
Esse ponto da Reforma Penal, um dos mais terroríficos, naquilo que agrava a execução da pena desnecessariamente (crimes não violentos), para além de tendencialmente implodir o sistema penitenciário, constitui o retrato fiel do neopunitivismo (neoinquisitorial) pregado pela criminologia populista/midiática.

Seria a mais draconiana inovação, não fossem as regras de fixação do regime inicial fechado (que também induzem ao encarceramento massivo) e a hedionda lista dos crimes hediondos, que abarca o homicídio qualificado, salvo quando também privilegiado, o latrocínio, a extorsão qualificada pela morte, a extorsão mediante sequestro, o estupro e manipulação ou introdução sexual de objetos, a epidemia com resultado morte, a falsificação de medicamentos e produtos afins, com resultado morte ou lesão corporal de terceiro grau, a redução à condição análoga à de escravo, a tortura, o terrorismo, o tráfico de drogas, salvo quando também privilegiado, o financiamento ao tráfico de drogas, o racismo, o tráfico de seres humanos, de órgão, tecido ou parte do corpo, a corrupção ativa e passiva, peculato e excesso de exação, os crimes contra a humanidade e o genocídio. Em todos os crimes hediondos a progressão só poderá ocorrer com o cumprimento de 2/5 da pena (primários) ou 2/3 (reincidentes).

Constitui erro crasso e pura demagogia eleitoreira relacionar como hediondos crimes não violentos. A corrupção, assim como os demais crimes decorrentes de fraude (não de violência), não deveriam jamais ser punidos com prisão, sim, com a pena de empobrecimento e ressarcimento do prejuízo causado.
BANALIZAÇÃO DO MAL
O eixo duro da Reforma Penal, constituído do agravamento do sistema progressivo, da fixação do regime inicial fechado e dos crimes hediondos, gira em torno da mesma lógica vingativa e supersticiosa do Malleus Maleficarum, de 1487 (o martelo das feiticeiras), com uma diferença: o sistema punitivo católico medieval acreditava na aberração das bruxas e do diabo, enquanto o sistema penal de 2013 acredita no mito e na superstição de que o endurecimento da pena diminui a criminalidade. Já fez isso, desde 1940, 150 vezes (foram 150 reformas do Código Penal, sendo 72% mais duras). Nenhum índice destes crimes diminuiu com tais reformas. Apesar dessa evidência palmar e mesmo não tendo como base qualquer estudo científico do efeito preventivo da política de mão dura, o legislador brasileiro mergulha profundamente nas crenças, falácias, mitos e superstições da criminologia populista/midiática, igualando-se nesse ponto ao homem das cavernas, que acreditava que possuía todos os animais pintados nas suas paredes.

OUTROS VÍCIOS
O texto final do novo Código Penal, ademais, comete um erro técnico/dogmático gravíssimo, ao supor que a teoria da imputação objetiva de Roxin (corretamente adotada) eliminaria a velha e boa relação de causalidade. Nada mais incorreto e absurdo. Uma coisa não elimina outra, visto que ambas ocupam espaços relevantes dentro da tipicidade formal e material.3 Ele permite, ademais, amplo alargamento da responsabilidade penal de quem podia agir e não agiu (fórmula aberta que possibilita a punição de todos os que estejam no campo fático do delito, sem nenhuma adesão subjetiva). Na criminalidade econômica, por exemplo, será possível criminalizar todos os que se situam na área da compliance e não tenham evitado o crime. Estamos diante de uma responsabilidade penal genérica e deslizante (que abarca o criminoso bem como todos os que estão envolta dele). Também é um erro a adoção da responsabilidade “penal” da pessoa jurídica nos crimes contra o meio ambiente, a ordem econômico-financeira e a Administração Pública, títulos que somam mais de uma centena de tipos penais. As multas previstas, desproporcionais, podem significar o fim da empresa. O Projeto ainda cria a figura de pescar cetáceos e chega a cominar pena de até oito anos para quem coloca galos para brigar, causando a morte do animal. Oito anos é a pena mínima do homicídio! Restringe a aplicação da insignificância em relação aos reincidentes (isso é puro Direito Penal de autor, que viola o Direito Penal do fato). Acertadamente mantém a descriminalização da ortotanásia.

PENA É VINGANÇA
Como bem diz o Relatório citado, “o Direito Penal, conforme já percebeu o Sociólogo Émilie Durkheim, mexe com o que há de mais passional no ser humano”. Ele lida com seus tabus assim como com o seu desejo ardente de vingança. Para Durkheim, não importa o tempo histórico, o Direito Penal foi e é ainda hoje vingança social. A pena no Direito Penal moderno continua sendo uma resposta a uma necessidade de vingança: “a pena permaneceu, para nós, o que era para nossos pais: ainda é um ato de vingança, já que é uma expiação”. O que vingamos, o que o criminoso expia, é o ultraje à moral, escreveu Durkheim em seu célebre Da divisão do trabalho social (2008, p. 60).
 
A pena continua sendo uma reação passional, apesar de, hoje, ter intensidade graduada em relação aos séculos passados. A Reforma Penal que ora se desenha é fascista naquela parte que agrava as penas ou sua execução desnecessariamente (Montesquieu e Beccaria diriam tirânica). Isso decorre da preocupação do Congresso Nacional de atender aos “anseios sociais” sem discernimento, o que pode até significar fartos ganhos eleitorais, mas não o isenta de ser inscrito no index da história macabra dos fascismos penais.

Luiz Flávio Gomes
Diretor-Presidente do Instituto Avante Brasil. Estou no professorLFG.com.br.
Revista Jurídica Consulex nº 407

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

O BRASIL ESTRAGOU TUDO
A revista The Economist estampou, na capa de sua edição de novembro de 2009, o título O Brasil decola, junto com a imagem do Cristo Redentor levantando voo. Dizia que o crescimento da economia brasileira de 5% ao ano iria acelerar com as novas reservas de petróleo. Foi um momento de êxtase para os festivos tupiniquins.
A edição de setembro de 2013 da The Economist traz de novo a imagem do Cristo Redentor, só que, desta vez, ele rodopia e imbica rumo à Baia da Guanabara. O título da matéria pergunta: O Brasil estragou tudo?. A reportagem diz que o crescimento econômico está travado. O êxtase de 2009 se transformou em vergonha.
Há dois anos, a revista britânica já vinha adotando um tom mais cauteloso. Classificou de medíocre o crescimento do Brasil e listou como motivos os elevados custos para fazer negócios, os riscos políticos e o protecionismo na exploração do petróleo.
As duas edições espelham a realidade. O País cresceu, em média, 4,8% anuais entre 2004 e 2008. Nos quatro anos seguintes, essa média caiu para 2,7%. Neste ano, deve ficar em torno de 2,4%.
A bonança da economia brasileira entre 2004 e 2008 ocorreu pela valorização de produtos importantes na pauta de exportações do País, como soja e minério de ferro, e pelo vigor do consumo doméstico. Tudo ia de vento em popa e ao governo cabia aproveitar o momento e promover ajustes para a economia continuar crescendo de modo sustentável. Porém, o PT falhou ao preferir curtir a popularidade em alta.
Quando a economia ia bem, seria a hora de investir em uma reforma tributária simplificadora, nos moldes do Imposto Único, que está parado no Congresso há 11 anos, visando reduzir custos dos negócios. Apenas para cumprir a burocrática legislação fiscal no País, as empresas gastam o equivalente a R$ 35 bilhões por ano.
Outra reforma que poderia ter avançado é a política, tendo como diretrizes dar fim aos políticos profissionais e desmantelar as organizações criminosas incrustadas no governo. Assim, poder-se-ia combater a endemia da corrupção, que impõe elevados custos aos negócios.
Além de não ter feito as reformas estruturais, o governo gerou insegurança para os investidores ao intervir na economia de modo desorganizado e com total viés político. A Petrobras, por exemplo, foi fragilizada por decisões tomadas nos gabinetes políticos, com os aspectos econômicos deixados de lado.
Outro aspecto é a ineficácia nas ações para expansão e manutenção da infraestrutura. Segundo a The Economist, o Brasil gasta apenas 1,5% do PIB nessa área, enquanto a média global é de 3,8%. As concessões do atual governo foram marcadas por fracassos e resultados pífios, como, por exemplo, os recentes leilões de rodovias.
Resultado ruim também ocorreu no leilão do campo de Libra, do pré-sal. Gigantes como Exxon e Chevron ficaram de fora, porque enxergaram riscos em colocar bilhões em um país cujo governo pode mudar as regras de uma hora para outra.
O governo errou em várias frentes, e o crescimento minguou. O ponto a ser contestado na matéria da The Economist é que o questionamento se o Brasil estragou tudo deveria ser corrigido para uma afirmação categórica dizendo que, de fato, o governo estragou tudo.
Fonte: Marcos Cintra
Doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e Professor Titular de Economia na Fundação Getulio Vargas. Foi Deputado Federal (1999-2003) e autor do Projeto do Imposto Único. É Subsecretário de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

As quatro chaves para liderar a geração Y e obter resultados extraordinários!
O choque geracional está instalado nas empresas. É cada vez mais comum encontrar líderes da geração X perguntando como fazer para liderar, engajar, desafiar, enfim, conviver com os profissionais da geração Y.

A maioria dos profissionais nascidos antes da década de 80 conheceu um mundo absolutamente diferente do atual. O ritmo de vida, as formas de relacionamento entre as pessoas, a quantidade de informações, procedimentos de trabalho, desejos e aspirações, entre muitas outras coisas eram absolutamente diferentes.

Já para a geração Y o mundo gira rápido. O conhecimento teórico recebido nas escolas e universidades já não dão conta da realidade com a qual eles se relacionam no cotidiano. Crenças e valores são outros, assim como seus desejos e aspirações. O imediatismo faz parte do seu modus operandi, afinal, basta pegar seu celular e, em poucos segundos, conseguem informações do que acontece no mundo todo. Isso os faz mais autossuficientes e autoconfiantes. Eles querem obter resultados rápidos e sem muito esforço, pois pertencem à era do conhecimento e da tecnologia, não da pesquisa, do “correr atrás”. 

O fato é que os “Ys” são muito diferentes de seus pais, e colocam em xeque muitos líderes despreparados para compreender suas características e necessidades. Além disso, estão pouco dispostos a flexibilizar seus pontos de vista ou mudar suas crenças e atitudes.

Por isso, é preciso se preparar e ter flexibilidade. Através de muito estudo e convívio com esses profissionais, desenvolvi quatro chaves que, além de ajudar os líderes a gerir sua equipe de “Ys” de forma eficiente, ainda os possibilita conquistar resultados extraordinários. São elas:

I – CONSTRUA UMA RELAÇÃO DE PROXIMIDADE
É preciso lidar com naturalidade, de igual para igual. Aproxime-se e conecte-se de um jeito muito especial. Busque compreender seu modelo e sua visão de mundo. Ouça na essência, olhe nos olhos, coloque-se no lugar dele, viva seu mundo, compartilhe suas inquietações e, sobretudo, deixe-o sentir-se seguro para poder extrair seu melhor. Aguce sua criatividade, parabenize constantemente seus logros e utilize um vocabulário próximo. Busque identificação de gestos e posturas para que ele possa reconhecê-lo como igual e confiar em você.

II – SEJA UM LÍDER AGREGADOR
Ofereça desafios e autonomia (lembre-se que eles gostam de se sentirem poderosos) e ofereça também suporte e orientação. Mais do que ditar regras unilateralmente, faça acordos e pactos onde sejam respeitados limites de ambas as partes. Busque sempre a participação nas decisões, por menor que seja. Fixe, sempre que possível em conjunto, prazos para entrega dos trabalhos. Mostre perspectivas de futuro próximo e festeje cada conquista por menor que seja. Feedbacks constantes são essenciais para evitar sair do trilho e motivar para a melhoria contínua e alcance de resultados.

III – MOSTRE QUE HÁ MUITO QUE APRENDER
Mas claro, de forma descontraída e de preferência divertida. Entretanto, não confunda divertido apenas com o sinônimo de risos e gargalhadas. Divertido também pode ser o desafio da pesquisa, a resolução de problemas, a descoberta de enigmas ou a resposta aos questionamentos. Utilize a criatividade para criar experiências diferenciadas e surpreendentes. Tenha sempre um roteiro claro do que você espera que ele aprenda e de como esse conhecimento pode ser aplicado à realidade.

IV – CRIE E SUPERE AS EXPECTATIVAS JUNTOS
Lembre sempre que esse grupo de profissionais é fruto da mudança. Portanto, promova mudanças e movimentos constantes, inspiradores e motivadores. Por menor que seja, esses profissionais precisam sentir o movimento das coisas. Imprima ritmo nas atividades, desperte o interesse a partir da participação nas decisões. Faça com que se sinta pertencente ao grupo o tempo todo. Crie expectativas de sucesso verdadeiro e deixe-o saber que ele faz parte desse sucesso. Peça ajuda, eles adoram sentir que podem contribuir para resolver um problema. Crie um ambiente de alegria, descontração e entusiasmo. Valorize, valorize e valorize!

A batalha pode até ser vencida com essas chaves, mas não a guerra. Siga esses passos, mas ciente de que, mesmo depois de tudo isso, o profissional da geração Y vai querer mais. Vai querer buscar outros mares para navegar, outras terras para explorar e outras estrelas para brilhar. Então, compreenda que eles são assim, e que você, como líder, terá um período de tempo de dois ou três anos fazendo o melhor para reter esse profissional. Depois disso, se você fez um excelente trabalho, terá um contingente de outros excelentes profissionais Ys querendo passar uma temporada com você e contribuir com seus projetos. Caso contrário, será o concorrente que irá atrair e ficar com a melhor equipe de profissionais Ys, o que certamente será uma catástrofe para você e sua empresa.

Aceite, o mundo mudou, as pessoas mudaram! E você?

MARCELA CLARO é Doutora, Mestre em Psicologia Organizacional e do Trabalho, Master Coach Sênior, atua com palestras e consultoria nas áreas de Gestão de Pessoas, Gestão de Desempenho e Gestão por Competências e autora do livro Os Segredos do Líder Coach Coach – Quatro chaves para liderar pessoas e obter resultados extraordinários.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Por que o TSE proibiu o MP e a polícia de investigarem?

Ou "A absoluta e flagrante inconstitucionalidade da nova resolução do TSE ?".
E começa tudo de novo. A população foi às ruas pedir a derrubada da PEC 37. O Congresso, assustado, por unanimidade atendeu aos apelos do povo. Pois não é que o TSE resolveu repristinar a discussão, por um caminho mais simples, uma Resolução?
Para quem não sabe, explico: pela Resolução 23.396/2013, o Ministério Público e também a Polícia de todo o Brasil não podem, de ofício, abrir investigação nas próximas eleições. É isso mesmo que o leitor leu. Segundo a nova Resolução – que, pasmem, tem data, porque vale só para 2014 – somente poderá haver investigação se a Justiça Eleitoral autorizar.
Então o TSE é Parlamento? Pode ele produzir leis que interfiram no poder investigatório da Polícia e do Ministério Público? Não acham os brasileiros que, desta vez, o TSE foi longe demais?
O Presidente do TSE, ministro Marco Aurélio, votou contra a tal Resolução, afirmando que "o sistema para instauração de inquéritos não provém do Código Eleitoral, mas sim do Código Penal, não cabendo afastar essa competência da Polícia Federal e do Ministério Público". Bingo! Nada mais precisaria ser dito.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Alexandre Camanho, afirmou que a medida é inconstitucional: "Se o MP pode investigar, então ele pode requisitar à polícia que o faça. Isso também é parte da investigação", afirmou.
Veja-se que a Resolução desagrada inclusive aos juízes (ou a um significativo setor da magistratura). Como diz o juiz Marlon Reis, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), a decisão é equivocada e pode trazer prejuízo à apuração de irregularidades nas eleições deste ano, verbis: "O Ministério Público precisa de liberdade para agir e deve ter poder de requisição de inquéritos. Assim é em todo o âmbito da justiça criminal e da apuração de abusos. Não faz sentido que isso seja diminuído em matéria eleitoral. Pelo contrário, os poderes deveriam ser ampliados, porque o MP atua justamente como fiscal da aplicação da lei".
Na visão do magistrado, a regra introduzida pelo TSE este ano é inconstitucional, pois "cria uma limitação ao MP que a Constituição não prevê". "O MP tem poderes para requisitar inquéritos, inclusive exerce a função de controle externo da atividade policial. Entendo que só com uma alteração constitucional se poderia suprimir esses poderes", explica. E eu acrescento: aliás, foi por isso que a PEC 37 foi rejeitada no Parlamento, porque é matéria constitucional.
A quem interessa essa limitação?
Nosso país é estranho e surreal. Avança de um lado, por vezes... E logo depois dá um salto para trás. Pergunto: em que a investigação de oficio – aliás, é para isso que existe o MP e a Polícia, pois não? – prejudicam o combate à corrupção eleitoral? Em quê?
Todos os dias Delegados e membros do Ministério Público investigam, sponte sua, crime dos mais variados em todo o território. A pergunta é: por que os crimes eleitorais seriam diferentes? No que? Por que mexe com políticos poderosos? O argumento do TSE não convence ninguém. Aliás, irônica e paradoxalmente, não convenceu nem seu Presidente, Min. Marco Aurélio. Espera-se que o STF declare inconstitucional essa medida. Na verdade, com tudo o que já se escreveu e discutiu sobre o combate à corrupção, investigação da polícia, MP, etc, até o porteiro do Supremo Tribunal já está apto a declarar inconstitucional a tal Resolução.
Numa palavra: O que fazer com o artigo 365 do Código Eleitoral? Uma Resolução vale mais do que uma Lei? E os Códigos Penal e de Processo Penal? Valem menos do que uma Resolução de um órgão do Poder Judiciário? Pode uma Resolução alterar prerrogativas constitucionais de uma Instituição como o Ministério Público?
Uma pergunta a mais: valendo a Resolução, o MP toma conhecimento de um crime e “pede” ao juiz para que autoriza a investigação... Suponha-se que o Juiz não queira ou entenda que não há motivo para a investigação. Faz-se o que? Recorre? Só que, na dinâmica de terrae brasilis, em que os feitos não andam, se arrastam, a real investigação que tinha que ser feita vai para as calendas. Eis obusílis da questão. Todo o poder concentrado no Juiz Eleitoral. É isso que se quer dizer com a palavra “transparência”?
Mais: qual é diferença de um crime de corrupção não-eleitoral com um de corrupção eleitoral? Por qual razão o indivíduo que comete crime eleitoral tem mais garantias – é o que parece querer ter em mente o TSE – que o outro que comete crime “comum”? Um patuleu comete um furto e qualquer escrivão, por ordem do Delegado, abre inquérito contra ele; mas se comete crime eleitoral... Há que pedir autorização judicial.[1] A pergunta fatal, para o bem e para o mal: não teria que ser assim em todos os crimes? Ou quem comete crime eleitoral possui privilégios sistêmicos? Não temos que tratar todos do mesmo modo em uma democracia?
Falta de coerência, integridade legislativa, prognose e violação daUntermassverbot
Poderia ser mais sofisticado e dizer, ainda, que a Resolução, ao “datar” um tipo de procedimento investigativo (só para 2014, diferenciando-o das eleições anteriores), é inconstitucional por aquilo que Dworkin chama de “lei de conveniência”, porque carecedora do elemento da coerência e da integridade legislativa. Mais ainda, a Resolução é inconstitucional porque ausente qualquer prognose. E se sabe que, hoje, é possível discutir a inconstitucionalidade a partir da falta de prognose. Em que, por exemplo, o processo eleitoral será mais limpo se se proibir a Polícia e o Ministério Público de investigarem sponte sua? Isso me parece irrespondível.
Ademais, também é inconstitucional a Resolução, levando em conta a falta de coerência, integridade e prognose, porque viola o princípio da proibição de proteção insuficiente (deficiente), chamada deUntermassverbot, já havendo precedente desse tipo de aplicação no Supremo Tribunal Federal. Ou seja, ao fazer a alteração, o TSE está protegendo de forma insuficiente/deficiente bens jurídicos fundamentais, como a moralidade das eleições, isso para dizer o mínimo. Ao proibir o MP e a Polícia de instaurarem investigações, o Judiciário (TSE) protege “de menos” a sociedade, porque dificulta o combate à criminalidade eleitoral.
De todo modo, como um otimista metodológico que sou – como sabem, sou da filosofia do “como se” (é como se [al sob] o Brasil pudesse dar certo) – penso que não é necessário dedicar tantas energias nessa Resolução que já nasceu morta. O Brasil se pretende sério. O povo quer que o país seja sério. Quer eleições com menos corrupção. Não me parece que o juiz saiba mais sobre abertura de inquérito que o Delegado e o membro do Ministério Público. Aliás, juiz julga. Polícia e Ministério Público investigam. Se o juiz já julga antes, para saber se é caso ou não de investigação – e não se diga que isto não é ato de pré-julgamento” - já está quebrado o sistema acusatório. Bingo! Mais um argumento que aponta para a inconstitucionalidade da Resolução.
Na verdade, parece que querem matar no cansaço a comunidade jurídica com esse tipo de discussão. Todos os dias surgem novas coisas para nos assustar. De um lado, o próprio STF aponta com quatro votos para a inconstitucionalidade de um modelo de doação de campanhas sem que a própria Constituição dê qualquer “dica” sobre qual o modelo a ser seguido. De outro, agora, o Tribunal Superior Eleitoral ingressa no cenário para proibir que a Polícia e o Ministério Público abram investigações de ofício naquilo que deve ser mais caro à cidadania: o-direito-fundamentalatermos-eleições-limpas.
Tristes trópicos, diria Claude-Lévi Strauss (o antropólogo e não o das calças jeans). Ou, como diria o Conselheiro Acácio, personagem de Eça de Queiroz: as consequências vem sempre depois.
A pergunta é: Dá para esperar?
[1] Alguém poderá argumentar: Mas a passagem pela “mão” do Juiz é apenas uma questão de burocracia, porque o art. 6º da Resolução diz que “Recebida a notícia-crime, o Juiz Eleitoral a encaminhará ao Ministério Público Eleitoral ou, quando necessário, à polícia, com requisição para instauração de inquérito policial (Código Eleitoral, art. 356§ 1º)”. Mas, pergunta-se: Então a Resolução teria sido feita para isso? O Juiz é um repassador de notícia-crime? Mas isso um estagiário pode (ria) fazer, pois não? Mas, daí vem outra pergunta: Por que o outro dispositivo (Art. 8º) diz que “O inquérito policial eleitoral somente será instaurado mediante determinação da Justiça Eleitoral”? Eis o busílis da questão!

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014


Maranhão dobra gasto com prisão terceirizada

Representante de uma das empresas que mais receberam verba é sócio de Jorge Murad, marido da governadora, em outro negócio
Maranhão dobra gasto com prisão terceirizada (© Estadão Conteúdo)
O gasto do governo Roseana Sarney (PMDB) com as duas principais fornecedoras de mão de obra para os presídios do Maranhão chegou a R$ 74 milhões em 2013, um aumento de 136% em relação a 2011. Uma das empresas que mais receberam verba, a Atlântica Segurança Técnica, tem como representante oficial Luiz Carlos Cantanhede Fernandes, sócio de Jorge Murad, marido da governadora, em outra empresa, a Pousada dos Lençóis Empreendimentos Turísticos.
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Em 2002, antes da eleição presidencial, a Polícia Federal apreendeu R$ 1,34 milhão em dinheiro vivo na sede da empresa Lunus, de Murad e Roseana. À época, em entrevista à revista Veja, Fernandes disse que parte desse dinheiro (R$ 650 mil) veio de empréstimo da sua empresa Atlântica. A Lunus ficava no mesmo endereço da Lençóis Empreendimentos.

A terceirização nos presídios é apontada pelo sindicato dos agentes penitenciários e pela oposição como uma das causas da barbárie no sistema carcerário do Maranhão.

Responsável por fornecer os guardas que fazem a segurança armada dos presídios, a Atlântica recebeu, em 2013, R$ 7,6 milhões da Secretaria de Justiça e Administração Penitenciária (Sejap).

Um ano antes, o valor era exatamente a metade: R$ 3,8 milhões. Ano passado, a Atlântica também tinha contratos com outros quatro órgãos estaduais e recebeu no total R$ 12,9 milhões do governo maranhense.

Já a VTI Tecnologia da Informação, responsável pelos sistemas de câmeras de segurança e pelos monitores que trabalham desarmados nos presídios, recebeu, em 2013, R$ 66,3 milhões da Sejap, montante 35% superior ao pago pela pasta no ano anterior. No site da Receita Federal consta que a atividade econômica principal da empresa é "consultoria em tecnologia da informação".

Locação de mão de obra temporária aparece como uma das quatro atividades secundárias. Em 2013, a VTI tinha contratos com outros três órgãos do Maranhão e recebeu no total R$ 75,8 milhões do Estado.

Desde 2009, primeiro ano da atual administração de Roseana, o gasto total do governo maranhense com essas duas empresas passou de R$ 10,1 milhões para R$ 88,7 milhões no ano passado - crescimento de 778%.

Presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Maranhão (Sindspem), Antonio Portela disse que a terceirização de pessoal começou com a decisão do governo Jackson Lago (2007-2009) de transformar as carceragens da Polícia Civil em unidades do sistema prisional.

"Como essas carceragens funcionavam em delegacias no interior do Estado, muitos agentes penitenciários que atuavam no Complexo de Pedrinhas, na capital, foram deslocados para essas regiões", afirmou Portela.

"Enquanto isso, a quantidade de presos foi aumentando. E, em vez de construir novos presídios e fazer concurso para agentes, o governo Roseana preferiu fazer uma 'privatização branca', contratando essas empresas terceirizadas."

Segundo o sindicato, o Maranhão tem 382 agentes penitenciários para uma população carcerária de quase 6 mil presos.

Portela afirmou que a Atlântica fornece guardas armados responsáveis pela segurança dos presídios. Já a VTI é responsável pelos monitores que andam desarmados e desempenham funções como condução de presos para banho de sol, visitas, encontros com advogados e revista em visitantes.

Treinamento. Uma das principais críticas é a falta de treinamento da mão de obra terceirizada que trabalha nos presídios. "Os terceirizados não têm treinamento adequado para lidar com presos. Além disso, são mal remunerados, o que favorece a corrupção. Daí a quantidade de armas, celulares e drogas encontrada no interior das cadeias. Um monitor da VTI recebe cerca de R$ 900 mensais, e um guarda da Atlântica, pouco mais de R$ 1 mil. Já um agente concursado ganha, em média, R$ 3,5 mil", disse o presidente do Sindspem.

O deputado estadual Rubens Júnior (PC do B), líder da oposição na Assembleia Legislativa do Maranhão, disse que quando a Casa retornar do recesso vai solicitar a suspensão dos contratos com a Atlântica e a VTI.

"A desativação das carceragens da Polícia Civil foi uma decisão acertada, já que a função dela é investigar crimes, e não custodiar presos. No entanto, presídio não é lugar para terceirizado. O Estado não tem como controlar a capacitação desses funcionários nem de acompanhar seu rendimento."

Outro lado. Em nota, o governo do Maranhão afirmou que a terceirização da mão de obra no Complexo de Pedrinhas "não tem nenhuma relação com os acontecimentos no presídio".

A gestão Roseana Sarney disse ainda que "os funcionários contratados de empresas especializadas são parceiros no trabalho dentro dos presídios" e que, "além de receberem capacitação na empresa, também são qualificados em cursos oferecidos pela Secretaria de Estado de Justiça e Administração Penitenciária (Sejap)".

Questionado sobre o motivo do crescimento do valor pago às empresas Atlântica e VTI, o governo respondeu que "o problema do sistema carcerário é nacional e tem sido combatido com uma série de ações pelos governos dos Estados e a União. A manutenção da estrutura requer investimentos efetivos em infraestrutura, mão de obra e qualificação".

Segundo o comunicado, o orçamento da Sejap para este ano é de R$ 149 milhões, o que representaria aumento de cerca de 75% frente a 2012.

A administração estadual do Maranhão negou que agentes penitenciários de Pedrinhas tenham sido transferidos para unidades no interior do Estado. Informou ainda que realizou concurso público para 41 agentes penitenciários em maio de 2013. Disse também que serão investidos R$ 131 milhões em recursos do próprio Estado para construção de novos presídios e reaparelhamento de todas as unidades, o que vai aumentar em 15% a quantidade de vagas no sistema.

Procuradas ontem pelo Estado por telefone, a Atlântica Segurança Técnica e a VTI Tecnologia da Informação não se manifestaram até o final da noite de ontem.

A reportagem foi informada que Luiz Carlos Cantanhede Fernandes, da Atlântica, estaria em viagem. Nenhum diretor da VTI foi localizado na matriz da empresa, em Fortaleza.

FONTE: Estadão/MSN.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Afaste-se, governadora!!

roseana o globo
Editorial / Jornal Pequeno
Não vamos aqui defender a pena de morte, nem pregar que os chefões do crime organizado sejam eliminados nas caladas da noite. Mas, sinceramente, tem gente que não merece viver. Quem é capaz de incendiar crianças merece ter um destino cruel, sofrer dores terríveis, arder no fogo de todos os infernos.
A gente liga a televisão nos canais de maior repercussão nacional e sai da sala com a impressão de que é tudo inútil, que o Maranhão chegou ao fundo do poço e não há mais nada a fazer; que não adianta ter esperança, nenhuma forma de esperança. Nem que venha da política, nem que venha do Poder Judiciário. O Estado caiu em desgraça, e o que se vê são medidas paliativas e algumas sem pé nem cabeça, como a construção de uma delegacia dentro da penitenciária. É de se pensar que pretendem fichar e prender os presos que já estão presos e condenados.
Nunca nestes quatro séculos pudemos sequer imaginar que São Luís se tornaria o que é hoje: uma praça de sangue e horror, com uma população ameaçada noite e dia pela incompetência, a ingerência, a devassidão nos negócios públicos. Todo bandido se sentirá bem num lugar assim, como se premiado com o paraíso que tomou às mulheres, crianças e aos homens de bem.
Não se discuta mais que temos um governo, não tenham mais o desplante de gastar milhões em órgãos de comunicação para dizer que o governo é bom. Roseana fracassou, a Justiça fracassou, a polícia está sendo metralhada nas ruas e as crianças estão pegando fogo dentro de ônibus. Junte-se ao faroeste das drogas, a devassidão dos crimes de colarinho branco e estará construído o inferno que ninguém deseja. De que vale toda a nossa cultura, toda a diversidade das folias populares e esse arquipélago arquitetônico construído pela História, se não conseguimos mais dormir e qualquer um pode morrer a qualquer momento?
Governados de dentro de um presídio, sob toque de recolher é um absurdo tão grande para nossas tradições de paz e solidariedade, que, mais uma vez repetimos, só nos resta rezar e continuar perguntando, estupidificados, o que foi que aconteceu aqui. No fundo do poço, sem saída como no filme, perturbados e confinados por mentiras eletrônicas, metralhadoras e garrafas de coquetel molotov. Quem diria!
Afaste-se, governadora, é o que de melhor pode fazer por esse povo. Os que governam o Maranhão governam há tanto tempo que sofrem de estafa, de lassidão, de insuficiência pública. Permitiram que aqui se instalassem todos os cancros humanos, como a agiotagem, a pistolagem, a crueldade inominável de quem queima crianças, destruindo famílias, como aconteceu com a família dessa garota indefesa que ardeu em chamas dentro de um ônibus atacado em seu percurso diário. Morreram a menor, o bisavô, e a mãe está hospitalizada, correndo risco de morrer também. Destruíram uma família. Estamos tristes. O povo do Maranhão está apavorado e decepcionado. E é uma gente que só está preocupada em viver.
FONTE: Publicado em  por raimundogarrone

Enquanto houver Democracia, o Judiciário é a esperança

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